segunda-feira, 30 de agosto de 2010

O ideal do homem romântico

Escrito em 05/08/2010

          Ele é mais forte, mais alto, mais velho e mais rico. Ele está sempre pronto pra nos proteger. É firme, não se deixa abater por qualquer adversidade. Não usa perfume, tem cheiro de homem. Ele troca o pneu, troca as lâmpadas, abre o pote de azeitonas. Ele nos leva em casa, abre a porta do carro, paga a conta. Nós achamos tudo isso lindo, o ideal do homem romântico. Mas é machismo.
          É óbvio que nos últimos anos tem ocorrido muitos avanços quanto ao lugar que a mulher ocupa em nossa sociedade, fruto de muitas lutas ao longo da história para que isso acontecesse. Mas a verdade é que nossa sociedade ainda é machista. Machismo que é por um lado contestado e modificado por muitas de nós mulheres, mas ao mesmo tempo incorporado e reafirmado por nós. Basta considerarmos esse modelo de homem ideal. Na escala hierárquica de uma sociedade patriarcal como a nossa, a mulher ainda é considerada o ser inferior e o homem o ser superior. O ser superior precisa defender o ser inferior, aquele que é mais frágil e fraco por sua natureza. A superioridade masculina é relacionada aos atributos que consideramos hierarquicamente superiores como altura, força e riqueza material. Afinal, de acordo com as hierarquias, o alto é superior ao baixo, o forte ao fraco, o mais velho ao mais novo e o rico ao pobre. Casais onde o homem é mais baixo, mais novo ou com menor poder aquisitivo do que a mulher são mal vistos simplesmente porque fogem do modelo estabelecido.
          A contradição começa quando nós, mulheres do século XXI, buscamos direitos iguais, mas homens à moda antiga ao mesmo tempo. Temos avanços, mas os valores machistas ainda permanecem, o que gera contradições. Eu mesma faço questão de rachar a conta e fui educada para “não depender de homem”(frase muito forte segundo a Mariana Beatriz, minha psicóloga). Acredito que se o homem quiser se depilar, fazer as unhas, pintar os cabelos e chorar vendo novela, ele tem todo o direito e não vai ser menos homem por isso (e se ele deixar de ser homem também é um direito dele, mas não é isso o que estou buscando discutir aqui). No entanto, o modelo está tão arraigado em mim que tenho que confessar que esse não é o tipo de homem que me atrai. Até gosto de homem com cabelo comprido (mas pensando bem agora, deve ser porque faz bem o estilo homem das cavernas mesmo), mas detesto homem com tinta no cabelo. Uma vez conversando com um garoto no qual estava interessada, ao perceber que ele era tão sensível quanto eu e que fazia tantos charminhos quanto eu, logo pensei: “que chato, que fresco, parece... mulher!” Ora, é claro que ele tem todo o direito de ser tão sensível quanto eu, é um ser humano. Mas crescemos ouvindo que os homens não choram e que não dizem “não” quando provocados pelas mulheres. Nas novelas, é sempre a mulher que está “com dor de cabeça”. O homem sempre vai dormir de mau humor quando isso acontece ou vai procurar uma amante que possa lhe satisfazer. E aí quando nos confrontamos com uma situação em que somos rejeitadas, nunca nos passa pela cabeça que pode não ter sido um dia bom para ele, que pode ser ele que está “com dor de cabeça.” A primeira coisa que pensamos é que existe algo de errado conosco. Afinal se os homens nunca dizem “não” e para mim ele está dizendo é porque existe algo de muito errado nessa história, algo de desviante, que foge da normalidade, que foge do modelo.
          A maior parte dos meus questionamentos eu passei a ter depois que cresci, mas desde que nasci eu fui educada, assim como a maior parte das mulheres de nossa sociedade, para ser independente financeiramente, mas, ao mesmo tempo, para ter como modelo de homem atraente o homem “macho”. Somos muito bem educadas para buscar nossa independência profissional, mas continuamos extremamente dependentes emocionalmente. E por isso, por mais que eu possa pegar um táxi e voltar pra casa sozinha, no fundo eu fico pensando “poxa, podia ter me levado em casa”. Por mais que eu possa e faça questão de rachar a conta, fico toda boba se ele insistir em pagar. E mesmo me dedicando muito aos meus estudos e buscando minha realização profissional, fico muito mais lisonjeada se ele disser que eu estou bonita do que se disser que eu sou inteligente.
          Mas essas coisas precisam ser mudadas. É uma relação hierárquica que traz limitações tanto para o dominado quanto para o dominador, embora o dominador tenha também muitas vantagens que fazem com que ele busque a manutenção do modelo estabelecido. É preciso romper com as relações de dominação para que todos passem a ter o mesmo campo de possibilidades de ser e não ser.


12 comentários:

  1. muito bom , só nao concordei com não usar perfume .. " macho " sim fedorento não .. uahuhaua gostei gostei !

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  2. ISSO QUE EU POSSO CHAMAR DE UM TEXTO INTELIGENTE ESCRITO POR UMA MULHER MAIS INTELIGENTE AINDA :D


    ASS:Leonardo Davi Coelho

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  3. Gostei. Talvez se minhas amigas pudessem ler isso aqui e o texto iluminasse mais um pouco a mente delas, eu ficaria muito feliz. Hahaha!


    Parabéns pelo texto e pelo blog (:

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  4. Muuito bom o seu texto, imprecionante a sua descrição real e racional da humanidade e sua "evolução" , muito boom de verdade , reflexão pura :]

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  5. "... e mesmo me dedicando muito aos meus estudos e buscando minha realização profissional, fico muito mais lisonjeada se ele disser que eu estou bonita do que se disser que eu sou inteligente".
    O fato de vocês estarem crescendo em termos profissionais e sociais não inflinge com nosso cavalheirismo. Se não houvesse diferenças entre sexos, o homossexualismo seria algo como almoçar.
    As diferenças nos atraem.
    Discordo de você, não é hierarquia. São apenas divergências de posições sociais em relações pessoais homem-mulher, excluindo o lado profissional, que não é afetado por isso. Por aceitar uma carona, o potencial da Maria Janúncia não diminuirá quando disputar o cargo da gerência da loja com o José Silva.
    Acho que vocês não inferiorizam-se por aceitar regalias de nós. É tradicional dos animais o macho atrair a simpatia fêmea com seus respectivos métodos, como expor suas belas penas, uivar, pagar um jantar, dizer coisas bonitas.
    Vocês possuem um sentimentalisto exacerbado natural. Nós o desenvolvemos.
    Claro, isso pode ser mudado. Temos a capacidade disso. Mas acho improvável.
    Resumindo com uma frase bem arcaica: "É assim que as coisas são".

    Com todo respeito ao seu post. Excelente, por sinal.
    Mas se não fosse as diferenças, o que aumentaria a vontade de viver ...

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  6. Eric, gostei muito de você ter expressado sua opinião divergente. O debate é sempre enriquecedor para repensarmos nos próprios conceitos e para a construção de nossos argumentos. Você levantou muitas questões que respondê-las poderia talvez até originar um outro texto. Mas vou tentar reponder por aqui, ressaltando que respeito sua opinião e o que vou escrever aqui é apenas o meu ponto de vista.

    Os homens são seres biológicos sim, no sentido possuírem necessidades vitais como comer, dormir, etc. No entanto, não somos animais irracionais cujo comportamento é determinado por instintos como é o caso dos outros animais. Nós somos seres pensantes e somos sujeitos históricos e sociais. A história está aí para mostrar que os homens viveram e vivem de forma muito diferentes ao longo do tempo e que mudanças sempre foram possíveis. As coisas não são como são. Elas não foram sempre assim. Elas foram construídas ao longo do tempo por sujeitos como nós. Aliás, acho que talvez nem seja preciso olha para trás pra compreendermos isso. Basta olhar pro lado e ver como as pessoas lidam de diferentes formas com as situações e como há hoje em dia sociedades vivendo de formas tão diversas no mundo, o que mostra que não existe um padrão de comportamento "natural". A possibilidade de mudança sempre existe e o que eu defendo é a possibilidade de mudança das relações de opressão e de dominação. Não estou defendendo que todos sejam iguais. Pelo contrário, estou criticando a existencia de um padrão a ser seguido por todos. O que eu defendo é justamente que haja uma igualdade no sentido de todos terem oportunidades e condições de serem aquilo que quiserem sem estar preso a um modelo pré-definido do que é ser homem e o que é ser mulher. Falo de uma questão de dominação e opressão porque não podemos negar que nossa sociedade ainda é machista. As mulheres estão conquistando seu espaço através de muitas lutas e esforço o que faz com que mudanças venham ocorrendo, mas ainda há coisas a serem mudadas. Mesmo no campo profissional, o homem ainda costuma levar vantagem quanto a salários e promoções. O que eu apontei é a necessidade de uma mudança em todos os pilares que sustentam essa sociedade machista, inclusive essas relações de dependência da mulher em relação ao homem que sustentam as ideologias que sustentam a dominação, como a idéia de que a mulher é inferior ao homem e por isso precisa ser protegida já que ela é mais frágil e menos capaz.

    Tentei resumir, mas mesmo assim o texto ficou enorme huaha.

    Bjão

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  7. adhaiodhiaosdhiasdh
    Compreendo. Pensei em uma tréplica, mas é melhor deixarmos para o próximo assunto ... discutir isso é como discutir futebol, ou política. Rende uma discussão eterna.
    Me verá mais por aqui ,
    Beijos !


    http://duasdedezideias.blogspot.com/

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  8. Oi Luiza :)

    o Eric havia me pedido para ler esse post e eu confesso que tive preguiça na hora, mas acabei por ler ... rs
    Gostei de lê-lo afinal, embora discorde em alguns aspectos.
    Você escreve muito bem mesmo e o texto mostra claramente sua profundidade em tratar o assunto.
    Eu discordo na verdade na sua resposta ... rs
    Somos animais sim, não nos livramos dos nossos instintos, podemos controla-los muitas vezes, mas não podemos nos livrar deles. E quanto às mudanças, estas podem acontecer por adaptação ou no sentido de revolução mesmo, tentar mudar o contexto no qual está inserido.
    Concordo também que somos seres históricos e sociais, mas se disser que a sociedade cria esse pensamento em todos, generaliza a situação.
    Somos formados por tudo que nos cerca, por quem encontramos, por quem conversamos, pelo que lemos, aprendemos em casa, na escola e só nos deixamos coagir por uma ideia, ou que quer que seja, um sistema dado, quando deixamos de refletir a essência, o sentido das coisas.
    Quando diz que espera que todos tenham a oportunidade de serem o que quiserem, é claro que a sociedade ainda nos fornece uma série de desigualdades, mas a motivação se carrega dentro de si.
    Sim, o salário dos homens é superior ao das mulheres ainda para a ocupação do mesmo cargo e se a mulher for negra então, o salário é menor ainda.
    É um absurdo, são coisas que devem ser mudadas e espero que sejam mesmo, e que não tarde.
    Mas enquanto não muda o que não podemos perder é a nossa essência, o que importa realmente para nós.
    Para algumas mulheres, o que realmente importa é ter alguém que a proteja, talvez por algum motivo que tenha acontecido em sua vida e isso realmente a faça feliz, independente do que foi aprendido.
    Você mesma disse no texto, que mesmo rachando a conta, ficaria feliz se o cara fizesse a questão de pagar, talvez não seja só o pensamento que foi contruído em você, TALVEZ, mas somente TALVEZ, seja o que quer mesmo.
    Tudo é relativo. Às vezes se rebelar sobre um determidado assunto e querer fazer que os outros "entendam" é apenas uma forma de fazê-los acreditar no que a gente acredita, ou no que a gente se força a querer acreditar.

    ...
    Desculpe pelo longo comentário. rs

    Um beijo!
    Também voltarei mais vezes :)

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  9. Paixão, não precisa se desculpar, pelo contrário. Foi ótimo seu comentário. Eu gosto quando as pessoas comentam sobre o conteúdo do que escrevo e, em especial nesse post, porque eu meio que esbocei as idéias, elas não estão fechadas. Então, outras opiniões me ajudam a pensar melhor no assunto.

    Eu também não acho que a sociedade cria esse pensamento em todos e as pessoas aceitam de forma passiva. Até porque a sociedade é formada por nós, não é uma força que está para além de nós e nos domina de forma que não possamos reagir. Pelo contrário, eu apontei justamente a possibilidade de mudanças e que cada pessoa lida com o mundo de uma forma e por isso mesmo eu apontei na minha resposta que eu não acredito que o homem seja guiado por um único padrão de comportamento "natural". O que eu acho que existe são padrões de comportamento dominantes criados socialmente pelos homens em cada contexto histórico e que são apresentados a nós como se fosse o certo a ser seguido e quem não o segue é visto como desviante, como algo fora do normal. Mas cabe a cada um escolher se vai segui-los ou não.

    Eu destaquei a minha opinião de que essas relações de dependência devem ser modificados porque acredito que elas sustentam uma ideologia de desigualdade social entre homens e mulheres. Elas legitimam a desigualdade. Não são ideias "inocentes", sabe. Por trás delas existe uma noção de que a mulher é inferior ao homem e isso sustenta o machismo.

    Eu não estou me rebelando sobre um assunto. Eu só expressei minha opinião no post e estou dialogando com as outras opiniões e esclarecendo a forma como eu penso. Até porque isso é uma forma de eu mesma parar para pensar sobre o assunto e organizar minhas idéias. Mas de maneira alguma eu quero forçar alguém a pensar igual a mim, até porque sei que esse é um assunto meio "polêmico", que não existe um consenso sobre isso. Tanto que falei no início da resposta que respeito a opinião do Eric, assim como respeito a sua e de todos sobre qualquer um dos posts. As críticas e opiniões diferentes da minha são muito bem-vindas.

    Beijos!

    Voltem sempre. :)

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  10. Sim, sim Luiza, e essa sua resposta ainda trouxe mais argumentos.
    Não acho que quer forçar ninguém a pensar como você, mas eu gostaria que muitos pensassem ... rs
    É só o prazer de discordar um pouquinho, como vc disse e eu tbm sempre digo, quando alguém discorda a gnt repensa e repensar traz um bocado de coisa nova a nossa cabeça ^^

    Grande beijo!

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