segunda-feira, 14 de junho de 2010

Memorial - Parte III

Ensino Fundamental

          Acredito que fui bem alfabetizada. No final da alfabetização, eu lia e escrevia bem para minha idade. A professora gritava muito às vezes e tinham uns dois alunos que não conseguiram acompanhar bem as aulas, inclusive uma aluna não passou de ano. Havia uma aluna que usava aparelho de audição e, por isso, também tinha dificuldades com a fala. Ela conseguiu se desenvolver bastante e se dava bem com as outras crianças. Lembro-me de brincar com ela também. Eu me lembro de uma garota mais velha, que tinha uns 10 anos e estava na nossa sala. Ela era muito quieta, sentava sempre na última carteira e nós tínhamos muito pouca ou nenhuma relação com ela. No final do ano nós produzimos um livro. Cada aluno escreveu uma redação sobre um tema e fez um desenho. A minha redação foi sobre o Natal e eu falei sobre Papai-Noel. Nela eu contei que ele já tinha existido mas não existe mais e que se tornou apenas uma lenda. Por isso hoje em dia algumas crianças não ganham mais presentes. Na formatura, eu fui a oradora da turma.
          Depois disso, a escola foi fechada e minha mãe reclama até hoje por não ter sido avisada. Os pais não foram comunicados e os alunos foram automaticamente matriculados no Centro Educacional Caminhar. A maioria dos meus colegas foram estudar no turno da manhã e eu continuei a estudar no turno da tarde. Não havia ninguém que eu conhecia na classe. A minha professora era a tia Letícia. Ela tinha 18 anos, todos os alunos gostavam dela e detestavam a professora da outra turma da primeira série, que era considerada mais bagunceira. A minha letra não era muito boa e eu me lembro de ela ter tido dificuldades para me ajudar nisso e chamou a tia Dodora, que era a diretora, para me ajudar. Houve uma época também em que eu estava esquecendo de fazer o dever de casa. Eu me lembro de que eu simplesmente esquecia mesmo, não era porque eu não quisesse fazer. Ela mandou eu conversar com a tia Magali, que era a outra diretora. Eu fiquei meio apreensiva por ir para a sala da direção. Mas ela foi bem legal comigo e perguntou porque eu não estava fazendo e eu disse que esquecia, que eu olhava na agenda e não sabia se já tinha feito ou não. Ela então me ensinou uma “técnica” que ela disse que tinha ensinado para o filho dela. Quando eu terminasse de fazer um exercício ou uma página do livro por exemplo eu deveria fazer um x em cima e, depois que tivesse acabado tudo, deveria fazer um “certinho”. Eu realmente passei a fazer isso sempre e não me esqueci mais de fazer o dever de casa. Continuei a fazer isso durante muito tempo, até a quinta ou sexta-série mais ou menos.
          Uma situação bastante marcante para mim foi uma vez em que a professora estava brigando com a turma por causa da leitura e depois disse: "É assim que um aluno de 1ª série deve ler. Leia, Luiza." Eu li, mas foi uma situação complicada para mim porque eu virei o centro das atenções e até hoje eu não gosto disso. Teve uma palavra que eu errei, que foi “pássaro” e eu li “passarinho” umas duas vezes. Eu acho que esse tipo de coisa me prejudicou bastante no Caminhar. Desde então eu me tornei “aluna exemplar”, seja por ser boa aluna, aplicada e tirar notas altas, como também por ser quieta e, portanto, comportada. Isso sempre me gerou uma cobrança muito grande, porque era como se as pessoas estivessem sempre esperando o melhor ou o “perfeito” de mim. Até a terceira série eu estava correspondendo a essas exigências que eu mesma acabava me colocando e, por mim, estava tudo bem. Eu conseguia me relacionar relativamente bem com as outras crianças e não tinha problemas com isso. 
          Na quarta-série, eu fui estudar no turno da manhã e, novamente, não havia quase ninguém que eu conhecia. Muitas crianças da minha turma saíram do colégio. Eu tive muita dificuldade de me integrar com as outras crianças, que eram bastante diferentes de mim. Aliás, eu não consegui me integrar e me fechei bastante. Comecei a sofrer muitas críticas por ser tão quieta, tão tímida, tão fechada. Ao mesmo tempo, sempre que eu fazia algo diferente disso, as pessoas se espantavam. No Ensino Fundamental isso piorou bastante para mim. Eu continuei sendo "excelente aluna", "exemplar" e não tinha nenhum problema de aprendizagem. Mas eu não estudava muito em casa, eu apenas fazia os deveres de casa e estudava um pouco para as provas. Mas os outros adolescentes me rotulavam de "CDF", dizendo que eu não fazia mais nada na minha vida além de estudar, que eu estudava o dia todo, sendo que isso não era verdade. Eu não saía com eles ou fazia outras coisas na hora do intervalo porque não conseguia me integrar e não por não ter tempo por estar estudando.
          Na terceira série foi quando eu tive meus primeiros contatos com a história. A disciplina era Estudos Sociais, mas me lembro de ter estudado sobre a história de Itaperuna, que foi algo que me interessou bastante. Até hoje eu me lembro de algumas coisas que aprendi sobre isso, até porque eu não voltei a estudar sobre o assunto posteriormente. Na quarta série, nós tínhamos um livro de História e Geografia. Eu me lembro de ter estudado História do Brasil, a partir de visão bem tradicional sobre alguns assuntos como uma abordagem sobre a Inconfidência Mineira que apresentava Tiradentes como um herói e que só foi morto por ser o mais pobre dentre os inconfidentes. Eu não me interessava muito por história até então. Quando me perguntavam qual era minha matéria preferida, eu dizia que era Ciências.
          Na quinta série, pela primeira vez, eu tive aula da disciplina escolar História. No Brasil, nesse ano, houve uma mudança nos currículos escolares e a História passou a ser uma disciplina obrigatória em todas as escolas, inclusive no primeiro segmento do Ensino Fundamental, onde a disciplina que eu havia tido era Estudos Sociais. Minha professora, a Renata, era uma ótima professora, com uma visão bastante crítica da história. Ela se preocupava em dar boas aulas e, depois de explicar a matéria, ela passava algumas questões para respondermos em casa. Na aula seguinte, ela pedia para que cada aluno lesse suas respostas de cada pergunta. Era um momento em que ela fazia as considerações sobre as respostas de cada um e aproveitava para discutir alguns tópicos. Ela conseguia ter “ordem” na turma em parte por dar boas aulas, mas também em grande parte por ter criado uma imagem de ser uma professora séria, grossa, que era ignorante às vezes. Ela também lia alguns textos do livro com a gente e discutia.
          A partir da minha quarta-série, o Caminhar fez uma parceria com o Pueri Domus, que é um sistema de ensino de São Paulo. A partir de então os livros de lá passaram a ser os livros adotados. Eram livros pequenos, que lançavam algumas questões, partindo da idéia de que o conhecimento seria construído em sala de aula pelos alunos e professores. Os livros de História possuíam muitas fontes primárias escritas e iconográficas. Ela discutia conosco algumas dessas fontes contidas no livro. Mas a realidade é que o livro não era muito usado. O conhecimento era construído mesmo a partir das anotações que ela fazia no quadro e do que ela explicava. Ela sempre dizia para que o anotássemos o que ela falava. Os exercícios que passava também eram muito relevantes, principalmente pela importância que ela dava a eles no momento da correção. Ela não conseguiu dar conta de explicar todo o conteúdo durante os quatro anos de Ensino Fundamental. Algumasmatérias, como feudalismo, ela retomou mais de uma vez e no final ela não conseguiu dar muitas aulas sobre o século XX. Muitos conteúdos importantes não foram explicados.
          Eu me interessei muito pela História desde a primeira aula que ela deu, na qual ela discutiu o que era história e para que estudamos história. Mas eu não sonhava em ser professora. Um dia ela deu uma aula sobre Ciências Auxiliares da História. Uma dessas ciências era a Arqueologia. Depois disso, nós aprofundamos um pouco mais sobre o assunto. Nós vimos onde estavam os principais sítios arqueológicos no Brasil, as diferentes teorias sobre a chegada do homem à América e fizemos um trabalho em grupo sobre os sambaquis. Desde então eu passei a querer ser Arqueóloga quando crescesse.

Um comentário:

  1. Oi! ainda bem que não esqueceu mais de fazer os exercícios de casa... aprendeu direitinho.
    bjs

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